sexta-feira, 16 de fevereiro de 2018

Instrução normativa-IN não pode restringir onde a lei não restringiu

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A contagem diferenciada de tempo é concedida aos trabalhadores que estiverem expostos a agentes nocivos. A previsão é constitucional e reproduzida na lei federal.
A lei não estabelece quais agente podem ser considerados ensejadores da contagem de tempo. Essa tarefa foi atribuída ao decreto regulamentador. O Decreto 2.172/97 não estabeleceu que apenas fontes artificiais poderiam ensejar a contagem de tempo especial. No entanto, a Instrução Normativa do INSS, em seu art. 281, assim restringiu, entendo que agentes naturais não ensejariam a contagem de tempo diferenciada.
A 2a Junta de Recursos, órgão subordinado ao Ministério do Desenvolvimento, e não ao INSS entendeu que a IN não poderia restringir onde a lei e o decreto não restringiram, considerando como especial o labor que expõe a agentes nocivos oriundos de fontes artificiais ou naturais.
Acompanhe a decisão na íntegra:

Número do Processo: 44233.154827/2017-21
Unidade de Origem: AGÊNCIA DA PREVIDÊNCIA SOCIAL HORIZONTE
Benefício: 42/176.932.414-0
Espécie: APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO
Recorrente: CARLOS AUGUSTO PEREIRA FELIX
Recorrido: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Assunto: INDEFERIMENTO
Relator: NOELIA MARIA VIDAL NUNES
Relatório Carlos Augusto Pereira Felix, devidamente qualificado nos autos, alegando a condição de segurado do RGPS, postula em 06/07/16 a concessão do benefício  APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO, indeferido em uma primeira análise, pelo INSS, tendo em vista a falta de tempo de contribuição. Compondo os autos temos os seguintes documentos e informações:
1. Dados do pedido de benefício, constando Data da Entrada do Requerimento - DER em 06/07/16 e data do nascimento em 22/07/60 - evento 04;
2. Declarações emitidas pelo Sindicato dos Trabalhadores nos Serviços de Capatazia Portuária nos Terminais Públicos, Privados e Retroportos do Estado do Ceará informando que o requerente contribuiu como trabalhador portuário avulso no período de 01/10/90 a 31/12/96, de 18/10/84 a 31/12/96, 01/01/85 a 30/12/96 e 02/01/85 a 30/08/01 e relações de salários de contribuição - evento 04;
3. Declaração emitida pelo Órgão de gestão de mão de obra do trabalhador do porto organizado de Fortaleza informando que o requerente trabalhou no porto com supervisão da mesma de 06/97 a 08/02 - evento 04; 4. Relação dos salários de contribuição do Sindicato com data de admissão em 01/01/85 e de desligamento em 30/12/96 - evento 04;
5. Relação dos salários de contribuição emitido pelo Órgão de Gestão constando data de admissão em 21/06/96 e sem data de demissão - evento 04;
6. Certidão de Tempo de Serviço Militar constando que o requerente serviu no período de 05/02/79 a 29/02/80 - evento 04;
7. Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP emitido pelo Sindicato dos Trabalhadores nos Serviços de Capatazia Portuária nos Terminais Públicos, Privados e Retroportos do Estado do Ceará, constando que o requerente trabalhou como trabalhador portuário, exercendo a função de capatazia no período entre 01/01/85 a 30/12/96 e exposto aos agentes nocivos: ruído entre 94 e 97 db(A), calor (25,2 a 31,5 Tbn) e poeiras de cereais - evento 04;
8. Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP emitido pelo Órgão de Gestão de Mão de Obra do trabalhador do porto organizado de Fortaleza (OGMO), constando que o requerente trabalhou como trabalhador de portuário avulso exercendo a função de portuário no período entre 01/01/97 a 31/03/02 e exposto aos agentes nocivos: ruído entre 76,0 e 85 db(A) e calor natural entre 27,2 e 34,1ºC - evento 04;
9. Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS com vínculos empregatícios intermitentes entre 18/10/84 e 07/13 (última remuneração) - evento 04;
10. Realizada pesquisa onde foi atestado a não confirmação dos recolhimentos nas competências: 10/84 a 12/84; 01/89; 02/89; 06/91 a 08/91; 03/94 a 05/94; 12/95; 04/98; 09/98; 07/00; 12/00; 09/01 a 03/02 – ev. 04;
11. Análise administrativa onde se se constata que nenhum período foi enquadrado como especial, por categoria profissional, com indicação de exposição à agente nocivo, necessitando, assim, de análise e parecer técnico pericial - evento 04;
12. Análise e Decisão Técnica de atividade especial concluindo pelo enquadramento do período de 01/01/85 a 30/12/96 e pelo não enquadramento do período de 01/01/97 a 31/08/01, com a justificativa de que para o agente CALOR, a fonte geradora de calor informada foi a NATURAL, no entanto este deve ser proveniente exclusivamente de fontes artificiais, conforme previsto no atrigo 281 da IN 77/2015 e quando ao agente RUÍDO, “o nível de exposição ao ruído , de 85 db(A), foi inferior aos limites de tolerância previstos na legislação em quase todo o período trabalhado, exceto de 01/01/97 a 05/03/97 que foi superior a 80 dB(A) e que não foi apresentado LTCAT para comprovação da efetiva exposição” – evento 04 13. Cálculo de tempo de Contribuição constando 22 anos, 3 meses e 3 dias - evento 04;
14. Carta de comunicação, indeferindo o pedido por falta de tempo de contribuição, sem ciência - evento 04; Recurso apresentado em 20/06/17, onde solicita a revisão de seu pedido de aposentadoria por sempre ter trabalhado com produtos químicos nocivos - evento 01; Após manifestação das contrarrazões do INSS, com manutenção do indeferimento em razão do requerente não ter atingido o tempo mínimo de contribuição uma vez que nem no PPP e nem no laudo técnico foram encontrados elementos para a comprovação da efetiva exposição aos agentes nocivos, os autos foram enviados à Junta de Recursos – evento 07; Inclusão em Pauta Incluído em Pauta no dia 31/01/2018 para sessão nº 0035/2018, de 07/02/2018. Voto Tratam os presentes autos de matéria recorrente neste Colegiado referente à pedido do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, a qual é devida ao segurado, desde que cumprida as exigências legais. O recurso é tempestivo e atende aos demais requisitos de admissibilidade. Dele tomo conhecimento. As normas vigentes estabelecem: Decreto 3.048/99:
Art. 56. A aposentadoria por tempo de contribuição será devida ao segurado após trinta e cinco anos de contribuição, se homem, ou trinta anos, se mulher, observado o disposto no art. 199-A
Art. 70.. “§1º A caracterizaçao e a comprovação do tempo de atividade sob consições especiais obedecerá ao disposto na legislação em vigor na época da prestação do serviço. §2º As regras de conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade comum constantes deste artigo aplicam-se ao trabalho prestado em qualquer período”.
Lei 8.213/91: Art. 57.. § 5º O tempo de trabalho exercido sob condições especiais que sejam ou venham a ser consideradas prejudiciais à saúde ou à integridade física será somado, após a respectiva conversão ao tempo de trabalho exercido em atividade comum, segundo critérios estabelecidos pelo Ministério da Previdência e Assistência Social, para efeito de concessão de qualquer benefício.
De acordo com o disposto na legislação citada, o tempo de trabalho exercido sob condições especiais que sejam ou venham a ser considerados prejudicais à saúde ou à integridade física será somado após a respectiva conversão ao tempo comum de trabalho exercido em atividade comum, segundo critérios estabelecidos pelo Ministério da Previdência e Assistência Social, para efeito de concessão de qualquer benefício. Conforme se depreende na documentação constante nos autos, foram alegados como exercidos em condições especiais, o período de 01/01/85 a 30/12/96 e de 01/01/97 a 31/03/02, em ambos, como trabalhador portuário avulso.
Acertadamente, na análise administrativa, não houve enquadramento dos períodos, uma vez que as atividades somente são analisadas até 28/04/95, e de conformidade com os anexos dos Decretos n. 53.831/64 e 83.080/79. Na análise técnica, não houve enquadramento do período de 01/01/97 a 31/03/02, uma vez que a exposição ao agente ruído, informado no PPP estava aquém dos limites, definidos nas normas legais, que não foi apresentado LTCAT, que a fonte geradora de calor deve ser proveniente de fontes artificiais e que não ficou comprovada a exposição de modo habitual e permanente aos agentes nocivos.
Em seu recurso solicita revisão e alega que trabalhou com produtos químicos nocivos. Todavia, verifica-se que não foi apresentado nenhum elemento novo que possibilitasse a alteração da decisão inicial, e seus argumentos não prosperam, conforme já devidamente justificado na análise técnica efetuada, o que permite concluir que o indeferimento foi correto, devendo ser mantido uma vez que o período contributivo alcançou apenas 22 anos, 03 meses e 03 dias, número insuficiente para atender os ditames legais.
NOELIA MARIA VIDAL NUNES
Relator(a)
Voto divergente vencedor
Peço datíssima vênia para discordar da Ilma. Relatora.
Compulsando os autos, percebe-se que a análise médica entendeu que o período não seria especial por ser oriundo de fonte natural. No entanto, não há previsão na Lei ou no Decreto Regulamentador que excetue a fonte natural como geradora de agente especial que caracterize a contagem de tempo diferenciada.
A Lei 8.213/91 estipulou que a aposentadoria especial seria devida ao segurado que estivesse exposto a agentes nocivos, tendo sido a habitualidade e permanência exigida a posteriori: Lei 8.213/91.
Art. 57. A aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995) A Lei 8.213/91 não limitou a garantia do benefício àqueles que estivessem expostos a um determinado rol de agentes nocivos.
A limitação dos agentes, no entanto, foi elaborada pelo Poder Executivo, através de Decreto Regulamentador, aprovado pelo Presidente da República e Ministro de Estado.
A República Moderna se distanciou do absolutismo quando separou os poderes. A Constituição Cidadã garantiu a aplicação do princípio da separação dos poderes, conforme seu art. 2°:
Constituição Federal. Art. 2º São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.
A República brasileira sedimentou a soberania popular como fundamento de sua formação e seu elemento mais intrínseco, garantindo que ao povo, através da representatividade, o exercício de seu poder.
Constituição Federal. Art. 1°. Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.
Nesse sentido, as Leis possuem processo legislativo distinto, que deve passar pelo crivo da maioria da representatividade. O processo legislativo garante que a representatividade será respeitada e, assim, a soberania da vontade popular.
Desta feita, somente através do devido processo legislativo é que se pode criar, ou melhor dizer, inovar no ordenamento jurídico pátrio. Os decretos regulamentadores, conforme estabelece a Constituição, podem ser emitidos pelo Presidente da República:
Constituição Federal. Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República: (...) IV - sancionar, promulgar e fazer publicar as leis, bem como expedir decretos e regulamentos para sua fiel execução;
Apesar de regulamentar a Lei, que não limitava os agentes nocivos, o Decreto 2.172, de 05/03/1997, apenas elencou quais agentes caracterizariam o tempo especial, não fazendo qualquer restrição que o agente especial ensejador da contagem diferenciada fosse somente aquele produzido por fonte artificial.
Portanto, ao estabelecer o INSS, em seu art. 281, da IN 77, que somente agente artificial ensejaria a contagem diferenciada, a autarquia extrapolou seus poderes, restringindo um direito que não foi restringido pela Lei 8.213/91 ou Decreto 3.048/99, alterado pelo Decreto 2.172/97.
A possível edição de um ato normativo por um poder singular, como é o chefe da Autarquia, não pode ultrapassar os limites da legislação, sob pena do risco de perda de soberania popular e do retorno ao poder uno, concentrado, que remete aos tempos sombrios do absolutismo. Nesse sentido, uma Autarquia não poderia se exceder e restringir um direito constitucional, garantido por Lei Federal, também não restringido pelo poder regulamentador do Decreto, somente através de uma instrução normativa que só exprime a lógica de um administrador (executivo), e que não representa a soberania popular, pois não fora erigido ao seu posto para legislar, mas tão somente para executar, padecendo, portanto, de inconstitucionalidade oblíqua. Sólida a lição da hermenêutica ubi lex non distinguir nec nos distinguere debemus (onde a lei não restringiu não devemos restringir).
Nesse sentido, a Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais possui entendimento de que, também, o agente nocivo oriundo de fonte natural, pode ensejar a contagem de tempo especial. In verbis:
5. Ao proceder ao exame da primeira alegação, observo que o Decreto n. 2.172/97 não mais fez restrição à admissibilidade de o calor, gerado por fonte natural, dar causa à especialidade do tempo trabalhado, se comprovada a exposição além do IBUTG previsto no Anexo 3, da NR 15, do Ministério do Trabalho e Emprego, o qual contém referência explícita à mensuração do calor em ambiente externo com carga solar. 6. A segunda alegação, relacionada à dificuldade de aferição do calor, por fonte natural, é também encontrada na literatura científica sobre o tema. A exposição à luz solar constitui elemento de risco à saúde do trabalhador se as condições de conforto térmico excedem os limites fixados pelas diretrizes do Ministério do Trabalho (art. 200, da Consolidação das Leis do Trabalho). As condições de conforto térmico são influenciadas pela sobrecarga térmica que pode advir das vestimentas usadas, da temperatura radiante média, fatores situacionais e condições pessoais do trabalhador. Entretanto, o calor gerado pela radiação solar é inconstante e de difícil mensuração, existindo diferentes parâmetros de medição, sendo o IBUTG um deles (cf. Fábio Moterani, “Radiação solar como agente insalubre”. Revista de Direito do Trabalho, v. 29, jan/fev 2013. Sérgio Ussan, “Exposição ao calor – O Anexo 3 da NR 15, que trata dos limites de tolerância, deve ser alterado?”. Caderno Informativo de Prevenção de Acidentes, dez 2016). Entretanto, a eleição do critério técnico para aferição do calor foge aos limites da competência do Poder Judiciário, o qual – ante a ausência de ilegalidade ou desproporcionalidade – deve observar a definição do parâmetro usado pela Administração Pública. Nesses termos, eventuais críticas lançadas ao IBUTG e àsdificuldade de mensuração do calor gerado por fonte natural em ambientes externos não eliminam a sua observância, cabendo ao responsável pelo laudo técnico declinar a fundamentação que, com apoio nos critérios técnicos, embasou seu posicionamento favorável, ou não, à nocividade da exposição. (...)
9. Por fim, no presente Pedido de Uniformização, o INSS aduz que as conclusões do PPP que instruiu a petição inicial indicam que as atividades desenvolvidas pelo segurado se davam de modo habitual e intermitente, o que impediria o reconhecimento da especialidade do trabalho exposto ao calor, por fonte natural. Assim, persistente divergência sobre a análise de prova, voto para conhecer parcialmente o Pedido de Uniformização do INSS e lhe dar parcial provimento a fim de que, fixada a tese jurídica, os autos retornem à Turma Recursal de origem para que proceda a um novo julgamento com base nas conclusões constantes no PPP, nos termos da Questão de Ordem n. 20/TNU. 10. É como voto.
No direito previdenciário, ou melhor, nas relações sociais do trabalho, tem prevalecido a teoria do risco integral, segundo o qual o empregador se responsabiliza pelo risco que corre o obreiro. Portanto, se o empregador expõe o empregado a uma atividade que o expõe a calor, mesmo que a fonte seja natural, não se pode eximir o que explora a atividade do risco a que expõe o segurado.
Segundo Maria Helena Diniz,
A responsabilidade objetiva funda-se num princípio de eqüidade, existente desde o direito romano: aquele que lucra com uma situação deve responder pelo risco ou pelas desvantagens dela resultantes (ubi emolumentum, ibi onus; ubi commoda, ibi incommoda).
Desta feita, considerando os valores republicanos da separação dos poderes, entendo que é o caso de realizar diligência para fins de solicitação de análise da especialidade do labor  enquanto o segurado esteve exposto a agente nocivo produzido, também, por fonte natural, a partir da edição do Decreto 2.172/97, em 05/03/1997. Portanto, conforme o art. 53, I, da Portaria MDSA 116/2017, entendo que é o caso de converter o julgamento em diligência para solicitar a APS:
1-Análise técnica do período a partir de 05/03/1997 em diante, independentemente da origem do agente nocivo;
2-Emitir parecer conclusivo fundamentado.
THIAGO LUIS DE OLIVEIRA ALBUQUERQUE
Conselheiro(a) Suplente Representante do Governo
Declaração de Voto
Conselheiro(a) concorda com voto do relator(a).
ELIZONEIDE RABELO DA SILVA
Conselheiro(a) Suplente Representante dos Trabalhadores
Voto divergente
Concordo com a diligência solicitado pelo Representante do Governo.
LYSLANE GOMES DE MELLO CARVALHO

Presidente

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