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Em sua última sessão, a Turma Nacional de
Uniformização dos Juizados Especiais Federais (TNU) fixou a tese pela
possibilidade de cessação do benefício através do mecanismo da alta programada.
Analisando as alterações legislativas sobre o assunto, a Turma
Nacional assim fixou seu entendimento:
a) os benefícios de auxílio-doença concedidos judicial ou
administrativamente, sem Data de Cessação de Benefício (DCB), ainda que
anteriormente à edição da MP nº 739/2016, podem ser objeto de revisão
administrativa, na forma e prazos previstos em lei e demais normas que
regulamentam a matéria, por meio de prévia convocação dos segurados pelo INSS,
para avaliar se persistem os motivos de concessão do benefício;
b) os benefícios concedidos, reativados ou prorrogados posteriormente à
publicação da MP nº 767/2017, convertida na Lei n.º 13.457/17, devem, nos
termos da lei, ter a sua DCB fixada, sendo desnecessária, nesses casos, a
realização de nova perícia para a cessação do benefício;
c) em qualquer caso, o segurado poderá pedir a prorrogação do benefício,
com garantia de pagamento até a realização da perícia médica.
Cabe a pergunta retórica: a TNU poderia “autorizar
a alta programada”?
A TNU entendeu que sim, calcando-se na ideia de
que a MO 767, convertida em lei, autorizou (ou legalizou) a alta programa.
A Constituição Cidadã previu como garantia
fundamental o respeito ao princípio do contraditório e ampla defesa
Art. 5º, LV
- aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em
geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a
ela inerentes;
Nesse sentido, o Supremo Tribunal federal fixou o
entendimento, em diversos julgados, de que o INSS não poderia sequer suspender
benefícios (suspensão é um ato reversível, portanto, com menos implicações que
a cessação) sem o respeito ao contraditório e ampla defesa, conforme julgamento
da ARE 795.248:
Entende-se que o direito
à defesa e ao contraditório tem plena aplicação não apenas em relação aos
processos judiciais, mas também em relação aos procedimentos administrativos de
forma geral. Dessa perspectiva não se afastou a Lei no 9.784, de
29.1.1999, que regula o processo administrativo no âmbito da Administração
Pública Federal. O art. 2º desse diploma legal determina, expressamente, que a
Administração Pública obedecerá aos princípios da ampla defesa e do
contraditório. O parágrafo único desse dispositivo estabelece que nos processos
administrativos serão atendidos, dentre outros, os critérios de ‘observância
das formalidades essenciais à garantia dos direitos dos administrados’(inciso
VIII) e de ‘garantia dos direitos à comunicação’(inciso X).(...) Assim, o
direito ao contraditório e à ampla defesa, com os recursos a ela inerentes, tem
âmbito de proteção de caráter normativo, o que, de um lado impõe ao legislador
o dever de conferir densidade normativa adequada a essa garantia e, de outro,
permite-lhe alguma liberdade de conformação. Ao regular o direito ao
contraditório e à ampla defesa, não pode o legislador desequiparar os
interesses e as partes em conflito, estabelecendo os meios necessários para que
se atinja o equilíbrio entre estas, garantindo, assim, tratamento paritário
entre as partes no processo”(grifo nosso). E, ainda, nesse sentido:
AI 501.805-AgR, Rel. Min. Joaquim Barbosa, Segunda Turma, DJe 23.5.2008; e RE
492.985-AgR, Rel. Min. Eros Grau, Segunda Turma, DJ 2.3.2007.Nada há, pois, a
prover quanto às alegações do Agravante.8. Pelo exposto, nego seguimento a este
agravo (ARE 795.248. art. 557, caput, do Código de Processo
Civil e art. 21, § 1º, do Regimento Interno do Supremo Tribunal
Federal).Publique-se. Brasília, 12 de novembro de 2010.Ministra CÁRMEN LÚCIA
Relatora.
Desta feita, cabe a indagação: a Lei pode tornar
legal algo inconstitucional?
Para a Kelsen, as normas são elaboradas de forma
escalonada, devendo ser compatíveis com a instância imediatamente anterior:
A ordem jurídica não é um sistema de normas jurídicas
ordenadas no mesmo plano, situadas umas ao lado das outras, mas é uma
construção escalonada de diferentes camadas ou níveis de normas jurídicas. A
sua unidade é produto da conexão de dependência que resulta do fato de a
validade de uma norma, que foi produzida de acordo com outra norma, se apoiar
sobre essa outra norma, cuja produção, por sua vez, é determinada por outra; e
assim por diante, até abicar finalmente na norma fundamental - pressuposta. A
norma fundamental - hipotética, nestes termos - é, portanto, o fundamento de
validade último que constitui a unidade desta interconexão criadora.
Assim, ainda que a Lei 13.457/2017 tivesse
alterado a lei federal para estabelecer um critério de definição de alta sem
cessação, a Lei não parece constitucional, parecendo o procedimento incompatível
com o entendimento sedimentado no Supremo.
Acompanhe mais um julgado sobre a temática:
Decisão. Vistos. Trata-se de agravo contra a decisão que não
admitiu recurso extraordinário interposto contra acórdão do Tribunal Regional
Federal da Primeira Região, assim ementado na parte que interessa:
“PREVIDENCIÁRIO. RESTABELECIMENTO DE BENEFÍCIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO. AMPLA DEFESA E DEVIDO PROCESSO LEGAL: AUSÊNCIA. SÚMULA 160 DO
TFR. APELAÇÃO PROVIDA” (fl. 499). (...). Por
outro lado, ainda que se entenda possível o exame da questão em julgamento, há
decisões desta Turma no sentido da necessidade de observância do princípio da
ampla defesa no processo administrativo que resulta na suspensão de benefício
previdenciário. (grifo nosso). Precedentes de ambas as Turmas. Agravo
regimental a que se nega provimento” (AI nº 501.805/PI-AgR, Segunda Turma,
Relator o Ministro Joaquim Barbosa, DJe de 23/5/08). Ante o exposto, conheço do
agravo para negar seguimento ao recurso extraordinário. Publique-se. Brasília,
12 de dezembro de 2012. Ministro Dias Toffoli Relator Documento assinado
digitalmente (ARE 681963, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, julgado em
12/12/2012, publicado em DJe-023 DIVULG 01/02/2013 PUBLIC 04/02/2013)
Em nosso sentir, cabe ao STF a última palavra
sobre essa temática, pois o Excelso Pretor já avocou para si a responsabilidade
de interpretar a Lei de Benefícios de acordo com os princípios do contraditório
e ampla defesa.
A TNU julgou por ter sido instada enquanto
intérprete da lei federal no âmbito dos JEF. Agora, esperamos que a matéria
seja suscitada do ponto de vista constitucional e que o Supremo consiga algum
tempinho, em meio a julgamentos de tantos políticos, para julgar matérias que interessam
ao dia-a-dia daqueles que buscam a proteção social.