quinta-feira, 1 de setembro de 2016

Aquisição de Direito e Direito Adquirido

Muitos amigos professores de direito previdenciário têm especialidade em uma área ou outra da disciplina. Uns amigos gostam de revisões, outros de benefícios rurais, outros por incapacidade e aí vai... Talvez pela experiência de ter trabalhando por alguns anos em balcões do INSS e ter assessorado juízes em órgãos jurisprudenciais nobres, a pergunta recorrente que me fazem é: “Por que o INSS nega tanto e o judiciário concede?”, quase indicando que minha especialidade deverá caminhar para a judicialização do direito previdenciário.
                As fundamentações para a existência de tal discrepância são muitas, mas a razão parece ser a mesma: a tentativa de afunilar direitos através de atos normativos que não têm aptidão jurídica para tanto.
                Recentemente foi editado o Memorando Circular Conjunto nº 40/DIRBEN/PFE/INSS. O memorando busca simplesmente afastar a proteção constitucional ao direito adquirido (art. 5º, XXV da CF). Passemos ao texto:
2. Observada a orientação contida no Parecer nº 000399/2016/CONJURMPS/CGU/AGU (Anexo I), em razão das alterações legais na análise dos benefícios que envolvam as matérias modificadas pela referida MP, devem ser observadas as orientações a seguir:
I - análise da carência exigida para os benefícios de auxílio-doença, aposentadoria por invalidez e salário-maternidade, cujo fato gerador (data do início da incapacidade - DII, parto, guarda, aborto ou adoção) tenha ocorrido a partir de 8 de julho 2016, inclusive, face o disposto no parágrafo único do art. 27 da Lei nº 8.213, de 1991:
a) se houver perda da qualidade de segurado, as contribuições anteriores à perda não serão consideradas para fins de carência;
b) o trabalhador/contribuinte que perder a qualidade de segurado deverá cumprir a carência mínima completa a partir da nova filiação, para voltar a ter direito aos benefícios de auxílio-doença, aposentadoria por invalidez e salário-maternidade;
                Em síntese, o memorando afasta o direito de quem já tinha resgatado sua qualidade de segurado antes da vigência da MP 739.
                Imagine que você contribuía há três anos para o INSS. Após quatro anos desempregado, conseguiu novo emprego em janeiro deste ano. De acordo com o “falecido” parágrafo único do art. 24 da Lei 8.213/91, a partir de abril você já estaria acobertado novamente sob o manto do cumprimento da carência. Espere aí... Então a aquisição do direito de resgatar tais contribuições já existia sim? Sim! E em nada deve ser confundido com o direito ao benefício previdenciário, que é um direito que demanda a reunião de vários requisitos, dentre os quais qualidade de segurado, ocorrência de um fato gerador e carência.
                Um direito, para ser adquirido, pode demandar outros direitos ou meros requisitos. Contudo, a implementação de um dos requisitos já é sua própria constituição como direito quando detentor de tal natureza.
Se para jogar uma partida de futebol eu preciso ter uma bola e vinte dois jogadores, a regra que agora demanda trinta jogadores não pode elidir o meu direito de já ter a posse da bola.
            Se o segurado já havia recuperado as contribuições pretéritas por ter cumprido 1/3 da carência exigida como previa a legislação, a aquisição deste direito autônomo e independente deve ser resguardada, pois não se confunde com o direito ao benefício que ainda não restara adquirido.
             Por que o INSS nega e o judiciário concede? Porque apenas menos de 11% dos benefícios são concedidos judicialmente, porque, por mais que não pareça, muitos brasileiros ainda são afastados de seus direitos e, ignorantes (desconhecedores) ou descrentes de nossas instituições, estão fadados a inércia que lhes afasta de seus direitos.

              Agora caberá à advocacia privada a defesa de tal premissa já defendida há tempos por Pontes de Miranda para garantir direitos.

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