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A contagem diferenciada de tempo é concedida aos trabalhadores que estiverem expostos a agentes nocivos. A previsão é constitucional e reproduzida na lei federal.
A lei não estabelece quais agente podem ser considerados ensejadores da contagem de tempo. Essa tarefa foi atribuída ao decreto regulamentador. O Decreto 2.172/97 não estabeleceu que apenas fontes artificiais poderiam ensejar a contagem de tempo especial. No entanto, a Instrução Normativa do INSS, em seu art. 281, assim restringiu, entendo que agentes naturais não ensejariam a contagem de tempo diferenciada.
A 2a Junta de Recursos, órgão subordinado ao Ministério do Desenvolvimento, e não ao INSS entendeu que a IN não poderia restringir onde a lei e o decreto não restringiram, considerando como especial o labor que expõe a agentes nocivos oriundos de fontes artificiais ou naturais.
Acompanhe a decisão na íntegra:
Número do Processo:
44233.154827/2017-21
Unidade de Origem: AGÊNCIA DA
PREVIDÊNCIA SOCIAL HORIZONTE
Benefício: 42/176.932.414-0
Espécie: APOSENTADORIA POR TEMPO
DE CONTRIBUIÇÃO
Recorrente: CARLOS AUGUSTO
PEREIRA FELIX
Recorrido: INSTITUTO NACIONAL DO
SEGURO SOCIAL - INSS
Assunto: INDEFERIMENTO
Relator: NOELIA MARIA VIDAL NUNES
Relatório Carlos Augusto Pereira
Felix, devidamente qualificado nos autos, alegando a condição de segurado do
RGPS, postula em 06/07/16 a concessão do benefício APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO,
indeferido em uma primeira análise, pelo INSS, tendo em vista a falta de tempo
de contribuição. Compondo os autos temos os seguintes documentos e informações:
1. Dados do pedido de benefício,
constando Data da Entrada do Requerimento - DER em 06/07/16 e data do
nascimento em 22/07/60 - evento 04;
2. Declarações emitidas pelo
Sindicato dos Trabalhadores nos Serviços de Capatazia Portuária nos Terminais
Públicos, Privados e Retroportos do Estado do Ceará informando que o requerente
contribuiu como trabalhador portuário avulso no período de 01/10/90 a 31/12/96,
de 18/10/84 a 31/12/96, 01/01/85 a 30/12/96 e 02/01/85 a 30/08/01 e relações de
salários de contribuição - evento 04;
3. Declaração emitida pelo Órgão
de gestão de mão de obra do trabalhador do porto organizado de Fortaleza
informando que o requerente trabalhou no porto com supervisão da mesma de 06/97
a 08/02 - evento 04; 4. Relação dos salários de contribuição do Sindicato com
data de admissão em 01/01/85 e de desligamento em 30/12/96 - evento 04;
5. Relação dos salários de
contribuição emitido pelo Órgão de Gestão constando data de admissão em
21/06/96 e sem data de demissão - evento 04;
6. Certidão de Tempo de Serviço
Militar constando que o requerente serviu no período de 05/02/79 a 29/02/80 -
evento 04;
7. Perfil Profissiográfico
Previdenciário - PPP emitido pelo Sindicato dos Trabalhadores nos Serviços de
Capatazia Portuária nos Terminais Públicos, Privados e Retroportos do Estado do
Ceará, constando que o requerente trabalhou como trabalhador portuário,
exercendo a função de capatazia no período entre 01/01/85 a 30/12/96 e exposto
aos agentes nocivos: ruído entre 94 e 97 db(A), calor (25,2 a 31,5 Tbn) e
poeiras de cereais - evento 04;
8. Perfil Profissiográfico
Previdenciário - PPP emitido pelo Órgão de Gestão de Mão de Obra do trabalhador
do porto organizado de Fortaleza (OGMO), constando que o requerente trabalhou
como trabalhador de portuário avulso exercendo a função de portuário no período
entre 01/01/97 a 31/03/02 e exposto aos agentes nocivos: ruído entre 76,0 e 85
db(A) e calor natural entre 27,2 e 34,1ºC - evento 04;
9. Cadastro Nacional de
Informações Sociais - CNIS com vínculos empregatícios intermitentes entre
18/10/84 e 07/13 (última remuneração) - evento 04;
10. Realizada pesquisa onde foi
atestado a não confirmação dos recolhimentos nas competências: 10/84 a 12/84;
01/89; 02/89; 06/91 a 08/91; 03/94 a 05/94; 12/95; 04/98; 09/98; 07/00; 12/00;
09/01 a 03/02 – ev. 04;
11. Análise administrativa onde
se se constata que nenhum período foi enquadrado como especial, por categoria
profissional, com indicação de exposição à agente nocivo, necessitando, assim,
de análise e parecer técnico pericial - evento 04;
12. Análise e Decisão Técnica de
atividade especial concluindo pelo enquadramento do período de 01/01/85 a
30/12/96 e pelo não enquadramento do período de 01/01/97 a 31/08/01, com a
justificativa de que para o agente CALOR, a fonte geradora de calor informada
foi a NATURAL, no entanto este deve ser proveniente exclusivamente de fontes
artificiais, conforme previsto no atrigo 281 da IN 77/2015 e quando ao agente
RUÍDO, “o nível de exposição ao ruído , de 85 db(A), foi inferior aos limites
de tolerância previstos na legislação em quase todo o período trabalhado,
exceto de 01/01/97 a 05/03/97 que foi superior a 80 dB(A) e que não foi
apresentado LTCAT para comprovação da efetiva exposição” – evento 04 13.
Cálculo de tempo de Contribuição constando 22 anos, 3 meses e 3 dias - evento
04;
14. Carta de comunicação,
indeferindo o pedido por falta de tempo de contribuição, sem ciência - evento
04; Recurso apresentado em 20/06/17, onde solicita a revisão de seu pedido de
aposentadoria por sempre ter trabalhado com produtos químicos nocivos - evento
01; Após manifestação das contrarrazões do INSS, com manutenção do
indeferimento em razão do requerente não ter atingido o tempo mínimo de
contribuição uma vez que nem no PPP e nem no laudo técnico foram encontrados
elementos para a comprovação da efetiva exposição aos agentes nocivos, os autos
foram enviados à Junta de Recursos – evento 07; Inclusão em Pauta Incluído em
Pauta no dia 31/01/2018 para sessão nº 0035/2018, de 07/02/2018. Voto Tratam os
presentes autos de matéria recorrente neste Colegiado referente à pedido do
benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, a qual é devida ao
segurado, desde que cumprida as exigências legais. O recurso é tempestivo e
atende aos demais requisitos de admissibilidade. Dele tomo conhecimento. As
normas vigentes estabelecem: Decreto 3.048/99:
Art. 56. A aposentadoria por
tempo de contribuição será devida ao segurado após trinta e cinco anos de
contribuição, se homem, ou trinta anos, se mulher, observado o disposto no art.
199-A
Art. 70.. “§1º A caracterizaçao e
a comprovação do tempo de atividade sob consições especiais obedecerá ao
disposto na legislação em vigor na época da prestação do serviço. §2º As regras
de conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de
atividade comum constantes deste artigo aplicam-se ao trabalho prestado em
qualquer período”.
Lei 8.213/91: Art. 57.. § 5º O
tempo de trabalho exercido sob condições especiais que sejam ou venham a ser
consideradas prejudiciais à saúde ou à integridade física será somado, após a
respectiva conversão ao tempo de trabalho exercido em atividade comum, segundo
critérios estabelecidos pelo Ministério da Previdência e Assistência Social,
para efeito de concessão de qualquer benefício.
De acordo com o disposto na
legislação citada, o tempo de trabalho exercido sob condições especiais que
sejam ou venham a ser considerados prejudicais à saúde ou à integridade física
será somado após a respectiva conversão ao tempo comum de trabalho exercido em
atividade comum, segundo critérios estabelecidos pelo Ministério da Previdência
e Assistência Social, para efeito de concessão de qualquer benefício. Conforme
se depreende na documentação constante nos autos, foram alegados como exercidos
em condições especiais, o período de 01/01/85 a 30/12/96 e de 01/01/97 a
31/03/02, em ambos, como trabalhador portuário avulso.
Acertadamente, na análise
administrativa, não houve enquadramento dos períodos, uma vez que as atividades
somente são analisadas até 28/04/95, e de conformidade com os anexos dos
Decretos n. 53.831/64 e 83.080/79. Na análise técnica, não houve enquadramento
do período de 01/01/97 a 31/03/02, uma vez que a exposição ao agente ruído,
informado no PPP estava aquém dos limites, definidos nas normas legais, que não
foi apresentado LTCAT, que a fonte geradora de calor deve ser proveniente de
fontes artificiais e que não ficou comprovada a exposição de modo habitual e
permanente aos agentes nocivos.
Em seu recurso solicita revisão e
alega que trabalhou com produtos químicos nocivos. Todavia, verifica-se que não
foi apresentado nenhum elemento novo que possibilitasse a alteração da decisão
inicial, e seus argumentos não prosperam, conforme já devidamente justificado
na análise técnica efetuada, o que permite concluir que o indeferimento foi
correto, devendo ser mantido uma vez que o período contributivo alcançou apenas
22 anos, 03 meses e 03 dias, número insuficiente para atender os ditames
legais.
NOELIA MARIA VIDAL NUNES
Relator(a)
Voto divergente vencedor
Peço datíssima vênia para
discordar da Ilma. Relatora.
Compulsando os autos, percebe-se
que a análise médica entendeu que o período não seria especial por ser oriundo
de fonte natural. No entanto, não há previsão na Lei ou no Decreto
Regulamentador que excetue a fonte natural como geradora de agente especial que
caracterize a contagem de tempo diferenciada.
A Lei 8.213/91 estipulou que a
aposentadoria especial seria devida ao segurado que estivesse exposto a agentes
nocivos, tendo sido a habitualidade e permanência exigida a posteriori: Lei
8.213/91.
Art. 57. A
aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta
Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que
prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou
25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei. (Redação dada pela Lei nº
9.032, de 1995) A Lei 8.213/91 não limitou a garantia do benefício àqueles que
estivessem expostos a um determinado rol de agentes nocivos.
A limitação dos agentes, no
entanto, foi elaborada pelo Poder Executivo, através de Decreto Regulamentador,
aprovado pelo Presidente da República e Ministro de Estado.
A República Moderna se distanciou
do absolutismo quando separou os poderes. A Constituição Cidadã garantiu a
aplicação do princípio da separação dos poderes, conforme seu art. 2°:
Constituição
Federal. Art. 2º São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o
Legislativo, o Executivo e o Judiciário.
A República brasileira sedimentou
a soberania popular como fundamento de sua formação e seu elemento mais
intrínseco, garantindo que ao povo, através da representatividade, o exercício
de seu poder.
Constituição
Federal. Art. 1°. Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por
meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.
Nesse sentido, as Leis possuem
processo legislativo distinto, que deve passar pelo crivo da maioria da
representatividade. O processo legislativo garante que a representatividade
será respeitada e, assim, a soberania da vontade popular.
Desta feita, somente através do
devido processo legislativo é que se pode criar, ou melhor dizer, inovar no
ordenamento jurídico pátrio. Os decretos regulamentadores, conforme estabelece
a Constituição, podem ser emitidos pelo Presidente da República:
Constituição
Federal. Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República: (...) IV -
sancionar, promulgar e fazer publicar as leis, bem como expedir decretos e
regulamentos para sua fiel execução;
Apesar de regulamentar a Lei, que
não limitava os agentes nocivos, o Decreto 2.172, de 05/03/1997, apenas elencou
quais agentes caracterizariam o tempo especial, não fazendo qualquer restrição
que o agente especial ensejador da contagem diferenciada fosse somente aquele
produzido por fonte artificial.
Portanto, ao estabelecer o INSS,
em seu art. 281, da IN 77, que somente agente artificial ensejaria a contagem
diferenciada, a autarquia extrapolou seus poderes, restringindo um direito que
não foi restringido pela Lei 8.213/91 ou Decreto 3.048/99, alterado pelo
Decreto 2.172/97.
A possível edição de um ato
normativo por um poder singular, como é o chefe da Autarquia, não pode
ultrapassar os limites da legislação, sob pena do risco de perda de soberania
popular e do retorno ao poder uno, concentrado, que remete aos tempos sombrios
do absolutismo. Nesse sentido, uma Autarquia não poderia se exceder e
restringir um direito constitucional, garantido por Lei Federal, também não
restringido pelo poder regulamentador do Decreto, somente através de uma
instrução normativa que só exprime a lógica de um administrador (executivo), e
que não representa a soberania popular, pois não fora erigido ao seu posto para
legislar, mas tão somente para executar, padecendo, portanto, de
inconstitucionalidade oblíqua. Sólida a lição da hermenêutica ubi lex non distinguir nec nos distinguere
debemus (onde a lei não restringiu não devemos restringir).
Nesse sentido, a Turma Nacional
de Uniformização dos Juizados Especiais Federais possui entendimento de que,
também, o agente nocivo oriundo de fonte natural, pode ensejar a contagem de
tempo especial. In verbis:
5. Ao
proceder ao exame da primeira alegação, observo que o Decreto n. 2.172/97 não
mais fez restrição à admissibilidade de o calor, gerado por fonte natural, dar
causa à especialidade do tempo trabalhado, se comprovada a exposição além do
IBUTG previsto no Anexo 3, da NR 15, do Ministério do Trabalho e Emprego, o
qual contém referência explícita à mensuração do calor em ambiente externo com
carga solar. 6. A segunda alegação, relacionada à dificuldade de aferição do
calor, por fonte natural, é também encontrada na literatura científica sobre o
tema. A exposição à luz solar constitui elemento de risco à saúde do
trabalhador se as condições de conforto térmico excedem os limites fixados
pelas diretrizes do Ministério do Trabalho (art. 200, da Consolidação das Leis
do Trabalho). As condições de conforto térmico são influenciadas pela
sobrecarga térmica que pode advir das vestimentas usadas, da temperatura
radiante média, fatores situacionais e condições pessoais do trabalhador.
Entretanto, o calor gerado pela radiação solar é inconstante e de difícil
mensuração, existindo diferentes parâmetros de medição, sendo o IBUTG um deles
(cf. Fábio Moterani, “Radiação solar como agente insalubre”. Revista de Direito
do Trabalho, v. 29, jan/fev 2013. Sérgio Ussan, “Exposição ao calor – O Anexo 3
da NR 15, que trata dos limites de tolerância, deve ser alterado?”. Caderno
Informativo de Prevenção de Acidentes, dez 2016). Entretanto, a eleição do critério
técnico para aferição do calor foge aos limites da competência do Poder
Judiciário, o qual – ante a ausência de ilegalidade ou desproporcionalidade –
deve observar a definição do parâmetro usado pela Administração Pública. Nesses
termos, eventuais críticas lançadas ao IBUTG e àsdificuldade de mensuração do
calor gerado por fonte natural em ambientes externos não eliminam a sua
observância, cabendo ao responsável pelo laudo técnico declinar a fundamentação
que, com apoio nos critérios técnicos, embasou seu posicionamento favorável, ou
não, à nocividade da exposição. (...)
9. Por fim,
no presente Pedido de Uniformização, o INSS aduz que as conclusões do PPP que
instruiu a petição inicial indicam que as atividades desenvolvidas pelo
segurado se davam de modo habitual e intermitente, o que impediria o
reconhecimento da especialidade do trabalho exposto ao calor, por fonte
natural. Assim, persistente divergência sobre a análise de prova, voto para
conhecer parcialmente o Pedido de Uniformização do INSS e lhe dar parcial
provimento a fim de que, fixada a tese jurídica, os autos retornem à Turma
Recursal de origem para que proceda a um novo julgamento com base nas
conclusões constantes no PPP, nos termos da Questão de Ordem n. 20/TNU. 10. É
como voto.
No direito previdenciário, ou
melhor, nas relações sociais do trabalho, tem prevalecido a teoria do risco
integral, segundo o qual o empregador se responsabiliza pelo risco que corre o
obreiro. Portanto, se o empregador expõe o empregado a uma atividade que o expõe
a calor, mesmo que a fonte seja natural, não se pode eximir o que explora a
atividade do risco a que expõe o segurado.
Segundo Maria Helena Diniz,
A
responsabilidade objetiva funda-se num princípio de eqüidade, existente desde o
direito romano: aquele que lucra com uma situação deve responder pelo risco ou
pelas desvantagens dela resultantes (ubi
emolumentum, ibi onus; ubi commoda, ibi incommoda).
Desta feita, considerando os
valores republicanos da separação dos poderes, entendo que é o caso de realizar
diligência para fins de solicitação de análise da especialidade do labor enquanto o segurado esteve exposto a agente
nocivo produzido, também, por fonte natural, a partir da edição do Decreto
2.172/97, em 05/03/1997. Portanto, conforme o art. 53, I, da Portaria MDSA
116/2017, entendo que é o caso de converter o julgamento em diligência para
solicitar a APS:
1-Análise técnica do período a
partir de 05/03/1997 em diante, independentemente da origem do agente nocivo;
2-Emitir parecer conclusivo
fundamentado.
THIAGO LUIS DE OLIVEIRA ALBUQUERQUE
Conselheiro(a) Suplente Representante do Governo
Declaração de Voto
Conselheiro(a)
concorda com voto do relator(a).
ELIZONEIDE RABELO DA SILVA
Conselheiro(a) Suplente Representante dos Trabalhadores
Voto divergente
Concordo com a
diligência solicitado pelo Representante do Governo.
LYSLANE GOMES DE MELLO CARVALHO
Presidente