Muitos amigos professores de
direito previdenciário têm especialidade em uma área ou outra da disciplina.
Uns amigos gostam de revisões, outros de benefícios rurais, outros por
incapacidade e aí vai... Talvez pela experiência de ter trabalhando por alguns
anos em balcões do INSS e ter assessorado juízes em órgãos jurisprudenciais
nobres, a pergunta recorrente que me fazem é: “Por que o INSS nega tanto e o judiciário
concede?”, quase indicando que minha especialidade deverá caminhar para a
judicialização do direito previdenciário.
As
fundamentações para a existência de tal discrepância são muitas, mas a razão
parece ser a mesma: a tentativa de afunilar direitos através de atos normativos
que não têm aptidão jurídica para tanto.
Recentemente
foi editado o Memorando Circular Conjunto nº 40/DIRBEN/PFE/INSS. O memorando
busca simplesmente afastar a proteção constitucional ao direito adquirido (art.
5º, XXV da CF). Passemos ao texto:
2. Observada a
orientação contida no Parecer nº 000399/2016/CONJURMPS/CGU/AGU (Anexo I), em
razão das alterações legais na análise dos benefícios que envolvam as matérias
modificadas pela referida MP, devem ser observadas as orientações a seguir:
I - análise da
carência exigida para os benefícios de auxílio-doença, aposentadoria por
invalidez e salário-maternidade, cujo fato gerador (data do início da
incapacidade - DII, parto, guarda, aborto ou adoção) tenha ocorrido a partir de
8 de julho 2016, inclusive, face o disposto no parágrafo único do art. 27 da
Lei nº 8.213, de 1991:
a) se houver
perda da qualidade de segurado, as contribuições anteriores à perda não serão
consideradas para fins de carência;
b) o trabalhador/contribuinte
que perder a qualidade de segurado deverá cumprir a carência mínima completa a
partir da nova filiação, para voltar a ter direito aos benefícios de
auxílio-doença, aposentadoria por invalidez e salário-maternidade;
Em
síntese, o memorando afasta o direito de quem já tinha resgatado sua qualidade de
segurado antes da vigência da MP 739.
Imagine
que você contribuía há três anos para o INSS. Após quatro anos desempregado,
conseguiu novo emprego em janeiro deste ano. De acordo com o “falecido”
parágrafo único do art. 24 da Lei 8.213/91, a partir de abril você já estaria
acobertado novamente sob o manto do cumprimento da carência. Espere aí... Então
a aquisição do direito de resgatar tais contribuições já existia sim? Sim! E em
nada deve ser confundido com o direito ao benefício previdenciário, que é um
direito que demanda a reunião de vários requisitos, dentre os quais qualidade
de segurado, ocorrência de um fato gerador e carência.
Um
direito, para ser adquirido, pode demandar outros direitos ou meros requisitos.
Contudo, a implementação de um dos requisitos já é sua própria constituição como
direito quando detentor de tal natureza.
Se para jogar
uma partida de futebol eu preciso ter uma bola e vinte dois jogadores, a regra
que agora demanda trinta jogadores não pode elidir o meu direito de já ter a
posse da bola.
Se
o segurado já havia recuperado as contribuições pretéritas por ter cumprido 1/3
da carência exigida como previa a legislação, a aquisição deste direito autônomo
e independente deve ser resguardada, pois não se confunde com o direito ao
benefício que ainda não restara adquirido.
Por
que o INSS nega e o judiciário concede? Porque apenas menos de 11% dos
benefícios são concedidos judicialmente, porque, por mais que não pareça,
muitos brasileiros ainda são afastados de seus direitos e, ignorantes
(desconhecedores) ou descrentes de nossas instituições, estão fadados a inércia
que lhes afasta de seus direitos.Agora caberá à advocacia privada a defesa de tal premissa já defendida há tempos por Pontes de Miranda para garantir direitos.