segunda-feira, 8 de agosto de 2016

Agentes biológicos: conceito específico de habitualidade

Habitualidade e permanência são requisitos necessários para o reconhecimento da contagem de tempo diferenciado. No entanto, a TNU tem precedente que entende que tal conceito deve especializado quanto se trata de agente biológico. Para tal agente, a aferição de existência ou não é de tal modo difícil que o mero risco de sua exposição já e é capaz de caracterizar o tempo especial.
Nesse diapasão, a 1a Turma Recursal da Justiça Federal do Ceará entendeu que poderia ser considerado como especial o tempo de labor do motorista de ambulância que transportasse pacientes e funcionários do hospital. O relator do voto é o juiz federal Bruno Leonardo Câmara Carrá. In verbis:

DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. ENTENDIMENTO. TURMA NACIONAL DE UNIFORMIZAÇÃO. CONVERSÃO DE TEMPO ESPECIAL EM COMUM. AGENTES BIOLÓGICOS. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE HABITUAL E PERMANENTE. DESNECESSIDADE. RECURSO PROVIDO. SENTENÇA REFORMADA.

RELATÓRIO
Dispensado o relatório, nos termos do art. 38 da Lei nº. 9.099/95, aplicável subsidiariamente aos Juizados Especiais Federais, a teor do art. 1º da Lei nº. 10.259/01.
VOTO
Trata-se de recurso interposto pela parte autora contra sentença que julgou improcedente pedido de concessão de aposentadoria especial em razão da não comprovação de tempo suficiente.
Alega em síntese o autor em suas razões recursais que desde 03/05/2000 o mesmo exerce a atividade de motorista de ambulância estando exposto a agentes nocivos à saúde, sejam vírus ou bactérias, sendo devido o reconhecido do tempo serviço como especial.
A aposentadoria especial, prevista constitucionalmente, é um benefício decorrente de trabalho realizado em condições prejudiciais à saúde ou à integridade física, e tem por fito compensar o trabalho do segurado que labora em condições adversas e com riscos superiores aos normais, tendo, portanto, quem assim exercita seu trabalho, o direito de converter o tempo de serviço prestado em condições especiais.
Como é sabido, a aposentadoria especial foi instituída por meio da Lei n.º 3.807/60 e regulamentada pelo Decreto n.º 53.831, de 25.3.64 que elencou as atividades profissionais classificadas como insalubres, perigosas ou penosas, as quais eram classificadas como especiais por simples enquadramento. Portanto, para a aposentadoria especial, assim como, para algum período de labor ser considerado especial, é pressuposto a agressão à saúde do indivíduo através da exposição a agentes nocivos no exercício de sua profissão.
Importa destacar que a Lei nº 9.032, de 28.04.1995, alterou a redação do caput do art. 57 da Lei 8213/91, afastando a possibilidade de enquadramento por simples exercício de atividade profissional, passando a ser admissível somente o enquadramento por efetiva submissão a agentes nocivos, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, porém ainda eram levados em consideração, para efeito de regulamentação, os Anexos I e II do Decreto nº 83.080/79 e o Anexo do Decreto nº 53.831/64, tendo tal situação perdurado até a edição do Decreto nº 2.172/97, que revogou os decretos de 1979 a 1964. De presunção absoluta, a lei passou a determinar que o segurado sempre comprovasse a efetiva exposição a agentes nocivos à saúde.
Em síntese, é possível reconhecer, como especial, o tempo de serviço prestado pelo trabalhador cuja atividade, antes da Lei nº 9.032/95, encontrava-se catalogada nos Anexos dos Decretos 53.831/64 e 83.080/79. Contudo, para o período posterior a 28/04/95, é necessária a comprovação da efetiva exposição, permanente, habitual e não intermitente, aos agentes nocivos à saúde e à integridade física do segurado, sendo aceito o Perfil Profissiográfico Previdenciário- PPP como documento comprobatório da exposição a agentes agressivos, desde que baseado em laudo técnico expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho (art. 58, LBPS).
No caso sob análise, a parte autora pretende que lhe seja reconhecido período laborado em condições especiais, para fins de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição.
Primeiramente, em relação ao período anterior à Lei nº 9.032/95, verifico que sua categoria profissional – motorista de ambulância – não se encontra no rol previsto pelos Decretos 3.831/64 e 83.080/79, no entanto o Perfil Profissiográfico Previdenciário- PPP indica exposição a vírus e bactérias.
Ressalto que o referido documento não indica claramente se o autor estava exposto de modo habitual e permanente aos agentes nocivos, sendo que no campo profissiografia, ao descrever as atividades exercidas pelo promovente, indica que ele transportava funcionários e ou pacientes da empresa seguindo rota pré-estabelecida.
Quanto ao ponto ressalto que a Turma nacional de Uniformização entende que no caso de agentes biológicos, o conceito de habitualidade e permanência é diverso daquele utilizado para outros agentes nocivos, pois o que se protege não é o tempo de exposição (causador do eventual dano), mas o risco de exposição a agentes biológicos.
Senão vejamos o a ementa do PEDILEF 50038617520114047209, Rel. Juíza Federal Kyu Soon Lee:
INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO INTERPOSTO PELO INSS. PREVIDENCIÁRIO. CONVERSÃO DE TEMPO ESPECIAL EM COMUM. AGENTES BIOLÓGICOS. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE HABITUAL E PERMANENTE EM PERÍODO POSTERIOR À ENTRADA EM VIGOR DA LEI Nº 9.032/95. DIVERGÊNCIA NÃO DEMONSTRADA. INCIDENTE NÃO CONHECIDO. 1. Prolatado acórdão pela Primeira Turma Recursal de Santa Catarina, a qual reformando a sentença, reconheceu como especial o período de 03/03/97 a 21/10/01, no qual a parte autora exerceu a atividade de Atendente Médico-Odontológica. 2. Interposição de incidente de uniformização pelo INSS. Alegação de que o acórdão impugnado reconheceu como especial período posterior à entrada em vigor da Lei nº 9.032/95 em que a parte autora exerceu a atividade de forma intermitente, contrariando, assim, o entendimento da Turma Nacional de Uniformização, segundo o qual para o referido período exige-se o exercício habitual e permanente. 3. Incidente admitido na origem, sendo os autos encaminhados à Turma Nacional de Uniformização e distribuídos a esta Relatora. 4. O acórdão da TNU trazido como paradigma (PEDILEF nº 2007.72.51.004347-2) deu parcial provimento ao Incidente do Autor, para o reconhecimento de especialidade da atividade de frentista somente até o advento da Lei nº 9.032/95 quando “habitual e intermitente”. 5. O acórdão recorrido considerou que, no caso de agentes biológicos, o conceito de habitualidade e permanência é diverso daquele utilizado para outros agentes nocivos, pois o que se protege não é o tempo de exposição (causador do eventual dano), mas o risco de exposição a agentes biológicos. Ou seja, para a Turma Recursal de origem, no tocante ao enquadramento de tempo de serviço especial após o início da vigência da Lei nº 9.032/95, não é necessário que a exposição a agentes biológicos ocorra durante toda a jornada de trabalho, pois, consideradas as particularidades do labor desempenhado, o efetivo e constante risco de contaminação e de prejuízo à saúde do trabalhador satisfaz os conceitos de exposição habitual e permanente. Assim, o acórdão recorrido não destoou do entendimento do acórdão paradigma, pois considerou a ocorrência de exposição habitual e permanente a agentes biológicos. 6. Não demonstrada divergência jurisprudencial em torno de questão de direito material. 7. Incidente não conhecido. (DOU 21/01/2014)
Assim sendo, em que pese o PPP não descrever que o autor estava exposto aos agentes biológicos de modo habitual e permanente, tenho que a atividade de motorista de ambulância se encaixa perfeitamente no entendimento acima descrito da Turma Nacional de Uniformização. Logo, considero como especial o período laborado a partir de 03/05/2000 na atividade de motorista de ambulância.
Logo passo ao cálculo do tempo contribuição considerando as informações constantes na CTPS e CNIS (anexos 05, 19 e 20):
Nascimento
21/10/60

DER 04/10/2013
Suporte Fático
Admissão
Demissão
Fator
Tempo
A
M
D
Autônomo
01/04/79
31/10/84
1
2.011
5
7
1
Alves e Carneiro Ltda
01/07/85
01/04/89
1
1.351
3
9
1
Araujo Cabral Ltda
02/05/89
31/10/91
1
900
2
6
0
Autônomo
01/01/93
31/10/99
1
2.461
6
10
1
Cont. Individual
01/11/99
30/04/00
1
180
0
6
0
Fundação Ana Lima
03/05/00
04/10/13
1,4
6.764
18
9
14
               
       
0
0
0
0
Total



13.667
37
11
17

Conforme se observa, no momento do requerimento administrativo (04/10/2013) o demandante preencheu o requisito temporal exigido para a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição ao perfazer 37 (trinta e sete) anos, 11 (onze) meses e 17 (dezessete) dias.
Ante o exposto, DOU PROVIMENTO ao recurso e JULGO PROCEDENTE o pedido formulado na inicial para determinar ao Instituto Nacional do Seguro Social – INSS que implante em favor da parte autora o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, no prazo de 30 (trinta) dias, fixando a DIB em 04/10/2013 (DER) e a DIP em 01/07/2016.
Sem condenação em honorários, uma vez que somente o recorrente vencido arca com tal ônus
Tem-se por expressamente prequestionadas todas as questões constitucionais suscitadas, uma vez que, para fins de prequestionamento, é desnecessária a indicação expressa de artigos e parágrafos da Constituição Federal, afigurando-se suficiente sejam as regras neles contidas o fundamento do decisum ou o objeto da discussão, como no caso ora sob exame (AI 522624 AgR, Relator Min. GILMAR MENDES, Segunda Turma, DJ 6.10.2006).
 
É como voto.
 
Fortaleza, 28 de julho de 2016.
 

Bruno Leonardo Câmara Carrá
Juiz Federal - 1.ª TR / 2.ª Rel.